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Um país que briga com a balança

domingo, 15 de abril de 2012

As balanças acusam os excessos e os especialistas dão o alerta: quase metade da população brasileira está acima do peso. Condição que a deixa suscetível a uma série de problemas de saúde ao longo da vida. Nos últimos seis anos, o percentual de quem está fora de forma passou de 42,7% para 48,5% e o de obesos, de 11,4% para 15,8%, segundo a pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), divulgada ontem pelo Ministério da Saúde. A tendência segue entre as crianças. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010, usados pelo ministério, mostram que 33,5% das crianças  entre 5 e 9 anos também estão acima do peso. Em 1989, esse percentual era de 13,5%. 

De acordo com o secretário de Vigilância em Saúde do ministério, Jarbas Vasconcelos, o Brasil está seguindo uma tendência mundial. “Todos os países que passaram por um período de transição demográfica estão nessa situação. Não estamos em um nível alarmante, mas, se a gente não adotar medidas agora, no futuro, vai ficar muito mais difícil conter essa onda”, ressaltou. Embora o índice de obesidade seja crescente, o Brasil ainda está longe de alcançar países como Argentina, Chile e Estados Unidos, que têm índices de 20,5%, 25,1% e 27,6%, respectivamente. 

E o hábito de se alimentar mal vem de longe, para o ministro Alexandre Padilha. Ele refutou a hipótese de que existe uma mudança nos hábitos alimentares dos brasileiros em decorrência do desenvolvimento social e econômico. “Não foram nos últimos seis anos que passamos a consumir mais refrigerantes, mais carne com gordura ou leite integral.”

A nutricionista Luciane Felix confirma o fenômeno de aumento de peso, principalmente entre as crianças. Segundo ela, os jovens estão comendo cada vez mais produtos industrializados, repetindo costumes dos mais velhos. “Esses hábitos começam a partir do exemplo dos pais. A vida corrida que os adultos levam faz com que eles optem por alimentos mais práticos e menos saudáveis”, avalia.

Bianca dos Santos Carvalho, 9 anos, é de uma família com histórico de obesidade. Acima do peso, a menina está há três meses se consultando com uma nutricionista. “Eu estava achando ela muito preguiçosa. Agora, ela está um pouco mais ativa. A médica quer que ela faça natação. Mas é difícil mudar a alimentação de criança”, conta a mãe, Juracy José de Carvalho, 46 anos.

Centros urbanos
O diretor da Sociedade Brasileira de Cardiologia, Carlos Alberto Machado, no entanto, acredita que o aumento do peso está diretamente associado ao fato de a maioria dos brasileiros viverem em grandes centros urbanos. “As pessoas estão se fechando cada vez mais devido à violência, estão ficando sedentárias e pedindo toda comida por ‘delivery’”, criticou. “A alimentação é o fator de risco comum para a maioria das doenças cardiovasculares e para os cânceres. A população tem que mudar os hábitos alimentares, a começar das crianças, e tem que fazer mais atividades físicas”, aconselhou. Machado ressaltou que a redução de riscos para a saúde é de 66% quando um sedentário passa a ser um pouco mais ativo. “Precisa de muito pouco para mudar: 30 minutos de exercícios cinco vezes por semana é capaz de fazer milagres.” 

Cada vez mais pessoas têm seguido esse tipo de conselho, indica a pesquisa. Nos últimos três anos, o índice de sedentarismo caiu de 16% para 14,1%. Os homens são os mais ativos: 39,6% se exercitam regularmente. No caso das mulheres, a frequência é de 22,4%. No DF, apesar de o índice de sobrepeso ser semelhante ao nacional (49%), a situação com relação à prática de atividade física é um pouco melhor que a média geral. Enquanto 30,3% dos brasileiros praticam atividade no tempo livre, 33% dos moradores da capital federal têm esse hábito. Além de mais ativos, os brasilienses dão exemplo entre os que comem mais frutas e hortaliças, com prevalência de 24%, contra 20% da média nacional.

Foco na prevenção
Realizada anualmente desde 2006, a Vigitel tem o objetivo de medir a prevalência de fatores de risco à saúde da população e subsidiar ações preventivas. Durante todo o ano passado, foram ouvidas 54.144 pessoas com mais de 18 anos em todas as unidades da Federação. 
As entrevistas foram feitas por telefone e duraram em média 
nove minutos e meio.

PALAVRA DE ESPECIALISTA » A influência da escola 
» Ana Maria Spaniol, nutricionista 
do Centro de Pesquisa em Alimentação Saudável, da Universidade de Brasília (UnB)

Os alimentos destinados às crianças contêm normalmente grandes quantidades de açúcares, sódio e gorduras, que, se consumidos em excesso e aliados ao sedentarismo, aumentam a chance de obesidade, cárie e doenças crônicas como pressão alta e diabetes ainda nessa fase da vida. Uma das estratégias para melhorar a alimentação é por meio do incentivo da própria escola à alimentação saudável. A escola deve incluir no aprendizado da criança conceitos que a levem a se alimentar e optar por escolhas mais saudáveis. Além disso, deve haver um aumento na oferta de alimentos saudáveis no ambiente escolar e uma redução na disponibilidade das opções ricas em gordura, açúcar e sódio. O consumo de frutas tem que ser incentivado seja por meio de oficinas ou de atividades educativas, como jogos, experimentos com alimentos e cultivo de horta.